Até mais ver

sábado, novembro 10, 2007

Poema em Linha Reta
"Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,

Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,

Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,

Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,

Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;

Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semi-deuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído.


Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza."

Fernando Pessoa

Portanto prezados, sejam bem vindos ao miserável mundo dos humanos, o meu mundo, o seu mundo, o nosso mundo, onde estamos miseravelmente sós. Podemos interpretar esta solidão tanto como abandono quanto como liberdade.
A escolha é, e sempre será vossa.
E para isso não podemos esperar garantias de ninguém! Afinal todos nós habitamos o mesmo território da dúvida.
Condecorações e até mais ver
Palilo
  • Facebook
  • Disqus
  • 3Blogger
comments powered by Disqus

3 Verdades

Gustavo Borim disse... [responder]

Sr. Virgulino,
Essa postagem não foi merecedora de um título, pois assim eu quis e assim deve ser!

PS: Coloquei o nome do poema certo?

Condecorações e até mais ver.
Palilo

mr.Poneis disse... [responder]

A pedra da rua.
Humilham-se sem cessar.
Ah! os pés humanos...

Até mais ver
三留 (mr. Poneis)

Ps.: http://www.seabra.com/haikai/

Anônimo disse... [responder]

As Pessoas só tem valor quando morrem...